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terça-feira, 12 de maio de 2015

NOTAS SOLTAS DA NET



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#poesia #Portugal
(...) Também escrevi em meu tempo cartas de amor, / Como as outras, / Ridículas. /
As cartas de amor, se há amor, / Têm de ser / Ridículas. /
Mas, afinal,/ Só as criaturas que nunca escreveram / Cartas de amor / É que são / Ridículas. (...)
poemas_alvaro_de_campos.jpg O trecho acima é de Álvaro de Campos​, um dos poetas criados pelo grande versejador Fernando Pessoa​. Álvaro é considerado o alter ego de Pessoa e demonstrou três fases distintas em sua criação: a decadentista (influenciada pelo Simbolismo, com poemas vertendo sobre o cansaço da realidade e a busca por novas sensações), a futurista (influenciada pelas vanguardas do século XX, especialmente pelo Futurismo, com produção cantando a velocidade da tecnologia, o belicismo das primeiras décadas dos anos 1900, é o canto de supremacia da civilização moderna e das máquinas) e intimista (de caráter niilista, é o desengano de tudo e de todos, volta ao canto do cansaço, mas sem busca de sensações, mas sim contraposição de uma infância arquetípica - época de total felicidade - a uma maturidade castradora de realizações). Nos versos acima, o termo "ridículo" remete à etimologia latina, na qual "ridiculus, -a, -um" era algo risível. O amor é engraçado; até mesmo quem não o pratica é digno de riso. Em suma, a realidade humana é permeada de riso, dada a fragilidade, a suposta ânsia de grandeza, que escamoteia um prosaísmo que atinge a todos. Já o poeta Fernando Pessoa ortônimo - ele mesmo, possui, na obra Cancioneiro, a mesma ânsia de explicar-se perante o mundo, destituindo de qualquer sacralidade o fazer poético. Chega a tangenciar os versos acima de Álvaro de Campos, o qual desmistifica as composições de amor, e se avizinha do poeta brasileiro Carlos Drummond de Andrade à época do livro A Rosa do Povo (1945), que elegeu o prosaísmo (o valor do cotidiano cru e nu) como mote da obra. Eis um trecho de Pessoa:
Dizem que finjo ou minto/ Tudo que escrevo. Não./ Eu simplesmente sinto/ Com a imaginação./ Não uso o coração./
Há aí um nó fulcral que liga Pessoa a Campos: ambos se despem do lirismo ebrioso que eleva os versos à busca de um êxtase quase supra-humano e faz da arte poética um braço do canto da realidade

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