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sábado, 10 de março de 2012

ACONTECEU COMIGO



Por horas de Baco – como vais, ó Região do Dão?

Por inculcas e a convite do meu Amigo, José Pinheiro, do Restaurante o Pinheirão, ali à saída para Silgueiros, logo a seguir ao Palácio do Gêlo, à esquerda, do outro lado da avenida. Cuidado, a quem estacione do lado descendente, cuidado com os "fângios" que por ali passam, olho vivo e pé ligeiro, recomendam-se, para quem tenha de atravessar a dita via.

E para a dita hora de Baco, estava anunciada a apresentação de Vinhos do Dão, duma recentemente instalada produtora do néctar de Baco, Virgínia Marques Barbosa Formoso, com os seus Quinta da Corga, de Penalva do Castelo.

Ao "paseillo" báquico, apresentaram-se 3 versões: uma em Rosado, outra em tinto e outra ainda, o senhor da noite, um Touriga Nacional de 2010, que arrebatou a Medalha de Ouro mais votada no XLIX Concurso – "Os Melhores Vinhos do Dão no Produtor". Sendo a mais pontuada, aquela medalha, o que lhe conferiu a designação de "Grande Vinho do Dão", para esta produtora, no seu T.N. 2010.

E tenho que fazer justiça, ao concedido galardão. De facto, foi um vinhaço, de se lhe tirar o chapéu, que tive o prazer de provar. Valeu a pena andar 95 kms, para um lado e para o outro, para vir encontrar um verdadeiro néctar do Dão.

Apresentou-se com uma cor retinta intensa, com ligeiras tonalidades violáceas, que me fizeram pensar, que teria por lá, mais qualquer coisa escondida, um Tinto Cão ou até um pouco de Jaen, mas enganei-me, aquando dos confirmandos.

Deu um aroma, também muito intenso a fruta preta, a denotar a tal boa maturação que a Touriga Nacional deve ter na região, para dar um grande vinho, como foi este caso, sem dúvida, um vinho com peso, que se sente na boca, que se come.

Na boca veio a encher tudo, encorpado, persistente, e a deixar-se ficar para um final bastante longo, de sabor aveludado, muito bem conseguido. Digamos que se trata dum vinho" com muita pata", que está para andar pela sua vida fora, nestes próximos 6/7 anos.

Portanto, desde já os meus parabéns ao responsável pela criação deste néctar penalvense, de eleição, um néctar que eu considero "de dentro", quero dizer, lá da terra, a fazer jus, às condições já exigidas no tempo de D. João I, por volta de 1412 (conforme minha consulta), …."se punia toda a pessoa que lá metesse vinho de fora do dito julgado ( o de Penalva), podendo perder o vinho e as vasilhas em que esse vinho de fora, fosse transportado."

Como não podia deixar de ser, deixo aqui as minhas saudações e parabéns ao meu Amigo, José Pinheiro, por estas iniciativas em louvor do néctar de Baco, e ao que sei, são para continuar. Siga a marinha, caro Pinheiro, há que continuar tão nobre

louvação em favor do néctar de Baco, que é a mais higiénica de todas as bebidas, como no seu tempo , Luís Pasteur o proclamou.

  1. Sabem que os bacilos do "tifo", após 15/30 minutos de contacto com o vinho a 10 graus, morrem, não provocando a chamada "febre tifóide" – já se viu algum bêbado apanhar esta febre? Não vamos agora andar bêbados, para não termos aquela febre, como é óbvio!!!!
  1. "o vinho é o pão dos diabéticos", desde que sejam "secos" e os espumantes sejam "brutos", pois destes, os secos têm açúcar;

Segundo alguns investigadores, vejam algumas vantagens do vinho:

  1. Favorece a diminuição dos resíduos, por ser diurético 8 obriga-nos a fazer xi-xi);
  2. Sustenta as forças e o bem estar, por ser tónico;
  3. Facilita a digestão de gorduras;

Etc…tc…etc…

O vinho, "é o sol engarrafado" – ouvi dizê-lo ao Eng. Manuel de Oliveira Silvestre ( da Bairrada ), numa das suas muitas palestras que lhe ouvi. Só por isto, está tudo dito – o sol engarrafado – além de ser um alimento privativo do homem, pois só este, bebe e gosta de vinho.

Se a um boi ou a um cão, oferecermos duas selhas, uma com vinho e outra com água, qualquer deles, vai beber a água, porque, não raciocinam, não falam, não cantam nem têm espírito.

Por falar em selhas com vinho, carreguem-se algumas e levem-se para o Terreiro do Paço, porque há por lá muita gente, a precisar de uma selhas do néctar, para lhes espevitar o espírito, por forma a que levem este país aonde devem e a curá-lo de tão grave doença de que enferma neste momento, mas não os deixem beber à lagardere, porque senão, ainda ficamos pior, se bem que, pior do que estamos, não sei se será possível.

Voltando ao vinho que esteve em prova no Pinheirão, sendo de Touriga Nacional, queria deixar aqui dito que, quem quiser aprender um pouco acerca desta casta, tem que vir ao Dão. Há por cá muito boa gente, que há meio século, vem estudando a casta rainha deste panorama báquico português, e lembro o grande trabalho que tem sido desenvolvido pelo Centro de Estudos Vitivinícolas de Nelas.

Também queria alertar para um facto: muita gente, de fora do Dão, tem a mania de dizer e até mandam umas bocarras, como por exemplo:"…ó a Touriga Nacional do Douro é que se vende, o resto é como se não existisse". Bom, quem dá uma bocarra como esta, o máximo que lhe poderei dar, numa escala de 20, não passará do 3. Por

um lado, uma cavalidade desta natureza, só revela falta de respeito pelos produtores de outras regiões que trabalham bem a Touriga Nacional, e neste caso o Dão.

É óbvio que o Douro ( que admiro a aprecio por diversas razões), tem grandes vinhos de Touriga Nacional, quer nos tranquilos quer nos Portos.

Seria mais correcto, mais cordato, fazer transparecer um equilíbrio, mostrando a cortesia necessária neste comentários, e muito mais ainda, quando proferidos numa roda de consumidores, apenas com o intuito de se pavonearem perante estes, dando-se como entendidos na matéria, puxando a brasa à sua sardinha, de uma forma condenável. Enfim, é o que temos. Mas, também é verdade, que certa gente desta, se passeia em revistas, sendo dados como entendidos na matéria. Cuidado, senhores produtores e técnicos do Dão. Se porventura vos baterem nas costas, num Palácio da Bolsa, numa FIL ou noutro sítio qualquer onde esteja a decorrer um evento báquico, tenham cuidado, olhem para o lado, e vejam de quem se trata.

Não sei como reagiria, o saudoso Grande Mestre do Dão, Eng. Magalhães Coelho, ao ouvir, tamanho impropério báquico, apesar da enorme simplicidade que sempre lhe conheci, nas mais diversas atitudes e situações que vivi com ele, mago do vinho, perante cuja memória, eu me curvo, pois a ele, muito se deve no Dão. Mais diria, mas não quero ferir susceptibilidades, quem sou eu para o fazer!

Deixou por cá, algumas puas de excelente qualidade, que tão bem, têm engarfado por toda a região do Dão. Uns, duma forma mais simples ( como ele ), outros de forma um pouco vaidosa ( que até se aceita ), efeitos decorrentes das modas do vinho, que temos vindo a presenciar. Mas, todas elas, são já o garante da afirmação que se tem vindo a verificar em toda a região do Dão.

"Puas" essas, com dois pés, e uma delas, a que eu mais admiro, dá pelo nome de Carlos Silva, para mim (sem desprimor para as outras "puas", que o Eng. Magalhães Coelho apurou e seleccionou), é já um garante da continuidade dos feitos báquicos daquele saudoso Mago Vinhateiro do Dão, um nome que jamais esquecerei e que perdurará nos Anais do Dão, se um dia vierem a ser feitos, como espero.

Aproveitem agora a época da poda, para recolherem umas varas jeitosas, para umas "valentes varadas" e sacudir-lhes o piolho da estupidez desses autores de tão descabidos impropérios, proferidos acerca da Touriga Nacional, que atrás referi.

Lá diz o velho ditado: " quem cala, consente".

Afastado que estou destas apreciações e intromissões, há já uma boa ½ dúzia de anos, pelo pouco que tenho sabido acerca do Dão, uma coisa me parece continuar a subsistir: os quintalinhos, aqui e acolá, sempre muito senhores do eu nariz, e depois,
não é por acaso, que facilmente descortino as enormes dificuldades da região, não só no aspecto económico, mas também noutros que lhe são inerentes.

Antes que seja tarde e para que vejamos recompensado ou que tenha valido a pena, o esforço dos produtores do Dão, façam o favor de se unirem e levarem os v/ vinhos lá fora. Neste campo, o Alentejo tem dado grandes lições acerca do espírito comunitário que caracteriza as diversas acções da região, fora de portas, como vai acontecer brevemente, mais uma vez, em terras de Vera Cruz.

Quero apelar aos técnicos desta nova geração: não deixem descaracterizar os vinhos do Dão .Digo isto, porque com todas estas modernices da enologia, parece-me que estamos a cair numa descaracterização, sem se dar por isso!

Quem não se lembra ( os novos de agora, não ) daqueles vinhos da Federação dos Viticultores do Dão? Aqueles rótulos cor de café com leite, da década de 70?! E aquela extraordinária Aguardente Velha, em garrafa de vidro tipo cantil?!

Falando de vinho, forçoso se torna, falarmos de comida, porque andam lado a lado, de contrário, corremos o risco de ficarmos entalados com qualquer coisa que não corra para baixo. E chamo em primeiro lugar, o marrano beirão, nele tudo se aproveita, que tem um bom final de vida, sendo engordado nos 1 ou 2 meses últimos da sua vida, com farelo de milho, couves e outros viços da horta, próprios de um condenado à morte, proporcionando às gentes da Beira Alta, o facto de poderem pôr à prova a sua argúcia culinária… E a mim que tanto gozo me dá, ver o povo, as gentes do campo, brilharem desta forma.

E lá vem o chibinho, com corninhos á nascença ( outros, põem-lhos já de grandes), saltitante, preparado lentamente do forno lá da casa, em caçoilões de barro preto, com batatolas loiras, acolitadas por grelinhos ( que agora, já os há à fartura), como aqui( cá para baixo) se faz com a chanfana, viçoso da horta que ao povo não falta, pois é ele que o semeia e apanha, à porta de casa ou ali perto, e ainda o arrozinho do forno, que belo manjar para esvaziar uma botelha dum belo néctar do Dão. E do farelo do milho que serviu para o marrano, saiu previamente a farinha para a broa, também cozida no forno, de boa côdea, a pedir uma molhadela num fundo de mel ou até acompanhando um queijo fresco, proveniente da feitura do queijo Serra da Estrela, do leite do ganau de pata rachada que também tem pêlo encaracolado. De resto, o viçoso da horta que por lá se cria, sem falta nenhuma, pois é abundante, sendo gáudio da mesa mais humilde, já que não lho podem tirar, pelo facto de quem o come, ser quem o semeia e colhe, ali perto. E que gozo isso me dá, ser possuído por quem o trabalha e colhe com sacrifício.

Não esqueço tudo o que é de encher a tripa do marrano, a tal carninha aos empurrões.

Como beirão guloso que sou por natureza, completa-se-me o odre, com os doces.

Os Doces de Ovos de Viseu, o Creme de Água de Oliveira de Barreiros, Silgueiros ( salvo erro) etc…tc…E o queijo Serra da Estrela, que chega até Penalva do Castelo, pela denominação da região, um verdadeiro transmissor do pulsar do sofrimento das gentes do cajado, de horas infindáveis nas invernias, que entram pelos ossos adentro, para acompanharem o ganau, na recolha a dente da sua subsistência, que pela manhã vai aquecendo, roendo uma gesta aqui e outra além, e vai charutando um bracejo aqui e outro acolá, depenicando uma cevadilha espontânea como complemento e delícia da pastagem.

E como disse Aquilino Ribeiro, " no Dão, há todo um sabor de lamber os beiços".

Honra, paz e glória, para as gentes do Dão.

Carlos Leitão

Carleiga@gmail.com

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